Por que você está considerando criar um laboratório de inovação? Esta é uma pergunta fundamental - a primeira de muitas - que precisamos responder antes de nos aventurarmos nesse fantástico mundo da inovação.
Diferentemente de outros processos de criação, a montagem de um laboratório de inovação não segue um método preditivo, com fases e etapas bem estabelecidas.
Criar um laboratório é um passo importante. Mas deve-se, antes, entender como a instituição está inserida dentro da cadeia de inovação.
A percepção geral é que a inovação é um mundo divertido, descolado e que sempre traz exposição e brilhantismo. Pode até ser, mas não é totalmente condizente com a realidade. Todo processo de inovação pressupõe, também, abertura ao erro. Por isso, é fundamental ter clareza dos motivos que levam a instituição a investir recursos, tempo e pessoas nessa trajetória, mapeando riscos e possíveis desencontros entre resultados e expectativas.
Vamos recorrer à literatura para nos ajudar nessa definição. Segundo Sano (2020, p. 17), “laboratórios de inovação no setor público são ambientes colaborativos que buscam fomentar a criatividade, a experimentação e a inovação por meio da adoção de metodologias ativas e da cocriação na resolução de problemas".
Existem, ainda, outras definições em relação a laboratórios de governos de instituições internacionais, presentes no mesmo estudo (Sano, 2020, p. 17), tais como:
1 - Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID): "Os laboratórios de inovação do governo são lugares dinâmicos que estimulam a criatividade para o design de soluções para políticas públicas. Esses laboratórios geralmente possuem equipes multissetoriais e abordam as questões de forma colaborativa." (Acevedo, Dassen, 2016, p.19);
2 - National Endowment for Science, Technology, and the Arts (NESTA): "Pode-se esperar que ocorra experimentação em um espaço seguro a uma distância da realidade cotidiana, com o objetivo de gerar ideias úteis que atendam às necessidades sociais e demonstrem sua eficácia". (Mulgan, 2014, p. 2).
Para nós, da Enap, "um laboratório de inovação no setor público é um espaço, físico ou virtual, onde times colaborativos exercem a experimentação de ideias, soluções e projetos, com base em metodologias centradas no usuário, para gerar valor público". E, como complemento, podemos entender ainda como "um espaço para gerar ideias funcionais para resolver necessidades sociais".
Um lab de inovação tem a capacidade de sensibilizar toda uma organização a inovar (o que chamamos de "inovação transversal" e não somente em locus, ou seja, em um setor específico). É, portanto, um mecanismo de disseminação dessa mentalidade de inovação, para fazer com que a experimentação seja uma rotina no trabalho e não um fato isolado.
Um lab de inovação também pode ganhar outros nomes, como 'centro de inovação' ou 'hub de inovação'. Em termos práticos, um lab promove um ambiente propício para trabalhos colaborativos e experimentais onde as pessoas se juntam para gerar ideias, explorar possibilidades e prototipar soluções para impactar serviços públicos. E isso se dá por meio de diversas ferramentas, processos, práticas e métodos, como o design thinking, por exemplo, buscando um só resultado: melhorar a vida em sociedade por meio da inovação.
Segundo o BID (Acevedo e Dassen, 2016, pág. 16), podemos classificar os objetivos em sete tipos:
# Objetivos de um lab de inovação na administração pública |
1 Fomentar um ambiente inovador |
2 Desenvolver inovações específicas |
3 Introduzir tecnologias |
4 Modernizar processos |
5 Criar novos mecanismos de participação cidadã |
6 Introduzir novos métodos de comunicação |
7 Abrir os dados da administração pública |
Podemos, ainda, elencar outros objetivos comuns: incentivar a criatividade; resolver problemas sociais complexos; ser espaço de trabalho colaborativo e cocriativo; gerar soluções verdadeiramente centradas em pessoas; promover experimentação e prototipação; desenvolver novas habilidades e capacitar servidores públicos; ser espaço de troca e aprendizagem.
Algumas atividades são fundamentais na criação de um laboratório de inovação para o setor público. Vamos a elas?
Para viabilizar os projetos, é necessário se conectar a instituições ou parceiros que tenham interesse, capacidade e recursos para tornar os projetos possíveis. O mesmo ocorre para cada projeto que será desenvolvido dentro do próprio lab após a sua criação.
É preciso considerar as pessoas que vão trabalhar nesse novo lab. É natural que, no início, a criação do lab seja feita por um time de servidores públicos, mas alguns labs podem precisar de outros profissionais no futuro, dependendo de seus objetivos, e, por isso, é importante se considerar a abertura de novas vagas por meio de concurso público, por exemplo. O GNova Lab possui um quadro permanente, porém há uma certa rotatividade e, por isso, precisa garantir a governança da informação e do conhecimento; já o LA-BORA! gov é considerado um case no modelo de trabalho, com times volantes.
Quanto mais diversidade, melhor. Processos de inovação trazem melhores resultados quando o time é composto por pessoas com diferentes competências e experiências, com diferentes visões, profissões e vivências. Como exemplo, um time ideal deve considerar profissionais que já praticam métodos de inovação, mas também acadêmicos, que já conhecem metodologias de pesquisas. Se o time é enxuto, vale considerar a contratação de consultores externos para garantir resultados melhores em cada projeto.
De acordo com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), as principais competências para um time de um lab de inovação são:
Quais projetos o lab vai tocar? Antes de embarcar nessa jornada, é ideal mapear a necessidade da gestão atual e a capacidade de absorção de projetos pelos times. Priorizar demandas e entender o escopo do lab é fundamental para se garantir o sucesso da iniciativa.
O mundo pós-pandêmico trouxe mudanças profundas na forma como as pessoas trabalham. Já não é mais obrigação para muitas corporações o encontro presencial, num local físico. A inovação não depende disso para acontecer: há laboratórios que trabalham remotamente, 100% online, o que favorece o acesso a diversos especialistas no Brasil e no exterior e traz mais multidisciplinaridade para o time. Existem outros, no entanto, que possuem espaços físicos para legitimar suas ações, o que também favorece alguns processos de cocriação. Qual cenário funciona melhor para a sua demanda? O mais importante é entender que a criação de um lab de inovação no setor público não exige um espaço físico obrigatoriamente.
Um lab de inovação demanda diferentes métodos e modelos mentais para funcionar bem. É importante ampliar o conhecimento com métodos baseados no Design e na experimentação. Porém, diferentemente de empresas do setor privado, o setor público traz camadas adicionais de complexidade, já que os resultados precisam trazer benefícios diretos para a sociedade, dentro das leis e normas públicas. Entender que um processo de inovação pode levar a casos de insucesso é condição sine qua non para embarcar no lançamento de um lab de inovação no setor público.
Um lab de inovação pode ser classificado de diferentes formas. Segundo o NESTA, podemos encontrar quatro tipos; já segundo Elisabete Ferrarezi, na publicação Reflexões sobre a criação de laboratórios de inovação pública, podemos adicionar um quinto tipo à lista. Veja abaixo:
# |
Classificação |
Características |
1 |
Desenvolvedores e criadores de inovação |
Voltados à solução de desafios específicos |
2 |
Facilitadores |
Preocupados com o engajamento de cidadãos, organizações não-governamentais e setor privado na busca de novas ideias |
3 |
Educadores |
Dedicados a promover mudanças na forma como as organizações públicas lidam com a inovação |
4 |
Arquitetos |
Focados num horizonte maior do que em uma solução específica, analisando o contexto social mais amplo |
5 |
Disseminadores |
Voltados a disseminar inovações próprias ou de outros órgãos governamentais, para amplificar seus impactos na sociedade |
O InovInmetro iniciou seu trabalho com o papel de educador interno, capacitando e aculturando os servidores do órgão. Depois, passou a desempenhar um papel de facilitador, implantando novas soluções dentro da instituição. Ou seja: um mesmo lab pode desempenhar diferentes funções ao longo do tempo, dependendo do contexto em que está inserido.
O GNova Lab transita entre o papel de educador, já que faz parte de um órgão educacional - a Enap -, mas também desempenha o papel de facilitador devido à maturidade já adquirida, prestando serviços para outros órgãos e projetos fora de sua governança.
Não é tarefa simples montar um lab de inovação. Reunimos alguns pontos-chave para você levar em consideração antes de criar um para sua repartição.
1 - Propósito
Qual é o principal objetivo desse lab de inovação? Seu propósito deve estar claro entre todos os envolvidos. É preciso qualificar internamente o que esse lab será e quais serão seus desafios ao longo do tempo.
2 - Projetos
Como atrair projetos e pessoas? Sem projetos definidos e pessoas disponíveis as ideias não saem do papel. É preciso dedicar estratégias para trazer projetos e interesses para a sobrevivência de longo prazo do novo lab.
3 - Entregas
Como e com qual velocidade as entregas serão feitas? Um lab que só pensa, mas não traz propostas concretas para problemas reais, é um lab que pode não prosperar. É preciso provar valor, sobretudo porque há um custo público envolvido.
4 - Capacitação
Como as pessoas envolvidas vão se capacitar? Um lab tem como objetivo gerar conhecimento, aprendizagem, trocas. É preciso garantir que os membros do lab tenham atualização constante, acompanhando novas metodologias, mudanças culturais e tecnológicas, porque o mundo da inovação não para.
5 - Reconhecimento
Como provar o valor desse lab? Um projeto como esse precisa se legitimar, para justificar sua criação, conquistar espaço e permanecer vivo e atuante. É preciso gerar reconhecimento para ganhar mais espaço entre financiadores, apoiadores, parceiros, colaboradores e políticos.
6 - Resultados
Quais são os principais indicadores de sucesso? O lab precisa comprovar suas entregas por meio de resultados concretos, sejam eles quantitativos ou qualitativos. É preciso ter esses indicadores definidos na largada e a cada novo projeto.
Como vimos, é um grande desafio lançar um lab de inovação. Antes de decidir propor um para sua área, vale refletir sobre alguns pontos:
1 - Se não há governança
Inovação e resolução de problemas públicos são temas inerentes à sua área de atuação? É necessário ter mandato para trabalhar com um lab de inovação.
2 - Se não há apoio de lideranças
Sua gestão está de acordo com os investimentos financeiros e humanos que serão despendidos nessa empreitada? Sem patrocínio político, o lab não sobreviverá.
3 - Se não há espaço para o erro
É permitido errar, e errar, e errar - e, claro, aprender com esses erros para evolução contínua? Inovação não é sucesso garantido, então essa cultura precisa existir.
4 - Se não há desejo genuíno
O lab está sendo proposto por pessoas realmente interessadas? "A cultura come a estratégia no café da manhã", disse Peter Drucker, um famoso escritor. É preciso que os envolvidos queiram ter um lab.
5 - Se não há demanda
Ainda é preciso criar uma mentalidade inovadora na área? Um lab busca fomentar a inovação, mas se essa cultura já é comum à instituição como um todo, o lab pode se ver sem função ao longo do tempo.
Embarcar nessa jornada pressupõe percorrer caminhos que nos ajudem a responder sim a essas perguntas.
Existem muitas variáveis a serem consideradas na hora de se criar um lab de inovação no serviço público. Para facilitar sua compreensão, reunimos alguns tópicos principais:
O que é um lab de inovação? |
O que não é um lab de inovação? |
Um espaço de testes e geração de novas ideias e tecnologias que beneficiem a sociedade |
Uma área que apenas recebe demanda e problemas de outras áreas, para que sejam solucionados por meio de processos criativos |
Um esforço coletivo envolvendo servidores e cidadãos na geração de impacto social positivo |
Trabalho individual em busca de reconhecimento ou promoção pessoal |
Um ambiente colaborativo que busca fomentar a criatividade, a experimentação e a inovação |
Um espaço colorido, moderno, cheio de post-its, onde as pessoas se encontram apenas para brainstormings e workshops |
Um lugar de metodologias ativas e criativas para a cocriação de soluções para problemas do dia a dia |
Um espaço fechado, restrito às pessoas que fazem parte dele ou exclusivo para servidores públicos envolvidos nos projetos |
Um movimento em prol de um mundo melhor a partir de soluções inovadoras |
Um time voltado apenas para a solução de problemas da sua instituição. |
Quais os passos que um servidor ou servidora pode seguir na hora de criar um lab de inovação para seu setor? Siga essa rota que, diferentemente de outros Épicos, é pouco linear. Considere como sendo esse, portanto, um modelo modular, porém com perguntas importantes a serem respondidas durante o processo.
Nem todo desafio pode ser resolvido por meio de um lab de inovação. Antes de percorrer esse caminho, o primeiro passo é responder a algumas perguntas-chave, como proposto por Elisabete Ferrarezi.
Perguntas que você terá que responder:
a - Qual a área temática, o problema ou desafio principal que será o foco do laboratório. Por que esse tema é relevante?
b - Quais são as motivações, os objetivos e ações que se pretende desenvolver com o laboratório?
c - Qual o público que se busca atender e de que maneira participará ou não do processo de inovação?
d - Por que um lab e não outro formato ou abordagem? O laboratório é a opção mais indicada para tratar esses temas?
e - Qual é o lugar desse laboratório no organograma institucional?
f - É necessário formalização? Como e por quem?
Um passo fundamental para a sobrevivência do seu lab de inovação é definir o modelo de trabalho dos times envolvidos.
Perguntas que você terá que responder:
a - Que tipos de competências o time em meu laboratório precisa ter?
b - Como podemos desenvolver as competências necessárias?
c - Qual será o formato de contratação dessas pessoas?
d - Qual é o custo previsto para essa operação?
É fundamental garantir uma estrutura para o seu lab, mesmo que inicialmente pequena. Complementar ao ponto anterior, é importante considerar também recursos financeiros e estrutura física e digital onde seus projetos serão desenvolvidos.
Perguntas que você terá que responder:
a - O lab terá um espaço físico? Onde e como será?
b - O lab vai atuar apenas de forma remota? Quais ferramentas vai utilizar?
c - Qual é o orçamento total disponível para o lançamento do lab?
d - Qual é a expectativa de orçamento disponível para cada projeto? Como vamos nos financiar?
Apesar de levantar as informações principais na primeira Ação, é necessário ir mais fundo na definição dos eixos temáticos que serão tratados pelo seu lab, além de levantar projetos potenciais.
Perguntas que você terá que responder:
a - Quais são os temas, em detalhe, com os quais o lab vai trabalhar?
b - Existem projetos-piloto para dar a partida? Quais?
c - É possível prever projetos futuros? Quais, quantos e para quando?
Inovação não é apenas inspiração. Inovação pede uma dose de transpiração e muito método, e muitos deles baseados no Design. Por isso, defina qual linha metodológica mais combina com seus objetivos, aperfeiçoe-se nela e depois expanda para outras abordagens.
Perguntas que você terá que responder:
a - Quais métodos vamos usar em nosso lab?
b - Como vou aculturar e capacitar o time em relação a esses métodos?
c - Como vamos evoluir, considerando outras abordagens metodológicas?
O serviço público tem o dever de retornar para a sociedade os investimentos feitos. Não é diferente para um lab de inovação. Garanta que seus esforços sejam reconhecidos e seus projetos tragam visibilidade, ampliando o apoio político.
Perguntas que você terá que responder:
a - Como é o contexto político e institucional e o patrocínio de dirigentes?
b - Como vamos dar visibilidade e publicidade às conquistas?
c - Quais são as estratégias para ampliar o apoio político para nosso lab?
d - O que fazer se os resultados não vierem como esperado?
Siga essa rota da forma como preferir, mas garanta que todos os pontos façam parte da sua proposta. E boa sorte!
A guide for making innovation offices work. IBM Center for the Business Government. Rachel Burtein e Alissa Black. 2014.
Colaboração internacional para inovação: o caso do GNova e do Mindlab. Isabella Brandalise, Elisabete Ferrarezi, Joselen Lemos. Brasília, 2018.
Como criar um laboratório de inovação em governo, de Elisabete Ferrarezi, 2022 (em construção).
Cómo potenciar la innovación pública a partir de la creatividad ciudadana. El método Santalab. SANTALAB. 2019.
Growing government innovation labs: an insider's guide. FUTUREGOV, 2017.
Experimentação e novas possibilidades de governo. Isabella Brandalise, Elisabete Ferrarezi, Joselen Lemos. Brasília, 2018.
Innovation: teams and labs - a practice guide. NESTA, 2014.
Laboratórios de innovación: una guía practica. UNICEF. 2012.
Laboratórios de inovação no setor público: mapeamento e diagnóstico de experiências nacionais. Hironobu Sano. Brasília, 2022.
Reflexões sobre a criação de laboratórios de inovação pública. Elisabete Ferrarezi. Brasília, 2022.
The radical’s dilemma: an overview of the practice and prospects of Social and Public Labs. Geoff Mulgan. UK: Nesta, 2014.
Chegamos ao final de mais um Épico. Para saber mais, acesse nossa página principal e confira outros conteúdos sobre como montar um laboratório de inovação no setor público.
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O Marco Legal das Startups criou o Contrato Público de Solução Inovadora (CPSI) que veio para viabilizar as compras públicas de soluções inovadoras.